Opinião: Marambá fala sobre a essência do Psytrance na cena atual

Publicado em 14/06/2016 - Por Camila Canabarro

 

Essência: Substantivo feminino. 1. Aquilo que é o mais básico, o mais central, a mais importante característica de um ser ou de algo. 2. Ideia central, argumento principal; espírito.

 

O psytrance surgiu do movimento hippie que pregava, entre outras coisas, PAZ, AMOR, UNIÃO e RESPEITO. É o espírito do PLUR que faz nossas celebrações se tornarem tão especiais e serem diferentes de qualquer outro tipo de festa. 

Com o passar dos anos a cena eletrônica têm se popularizado e o Trance tem tomado grandes proporções. Do ponto de vista artístico é excelente, pois aumenta muito o número de pessoas interessadas pela cena e com vontade de se expressar através da música ou qualquer outro tipo de arte. O resultado disso tudo é o que vemos hoje: cada vez mais artistas de qualidade surgindo e criando músicas com identidade própria. Mas também há quem afirme que, quando uma cena cresce e se populariza, acaba perdendo sua essência. Para João, responsável pelo projeto de Psytrance Marambá não é bem assim:

“Eu não concordo com a ideia de que a popularização implica em perda de qualidade, mas acredito que a essência pode ser prejudicada quando os eventos atingem proporções gigantescas”.

Com a popularidade da cena é natural que muitas pessoas mergulhem de cabeça nos festivais sem muito interesse em descobrir como as “coisas funcionam”, achando que toda festa é festa. Com o passar do tempo esse tipo de público tende a aumentar e o resultado é o que temos visto nos últimos tempos: roubos, violência e outras coisas que não fazem parte da cultura trance agora são registrados com frequência em diversos festivais.

“a diversificação e multiplicação do público pode atrapalhar a essência no sentido de não haver mais uma união e uma sintonia entre as pessoas presentes, pois em festas gigantes isso é difícil de acontecer”

 

Confira o comentário completo de Marambá:

No caso do trance psicodélico, eu não concordo com a idéia de que a popularização implica em perda de qualidade, mas acredito que a essência pode ser prejudicada quando os eventos atingem proporções gigantescas.

Quando pensamos no rock psicodélico, no metal, no punk, no techno e outros movimentos culturais, acho que as pessoas fazem esse comentário principalmente porque o público se diversifica e a arte se transforma. O psytrance é um caso muito particular nesse sentido porque ele já teve um auge no Brasil e uma explosão que causou bastante impacto. O público sempre foi cíclico, são poucas as pessoas que conheço que frequentam e/ou trabalham nos festivais desde a época em que comecei, mas apesar do público ser renovado continuamente, sempre existiu uma similaridade. Por outro lado, a diversificação e multiplicação do público pode atrapalhar a essência no sentido de não haver mais uma união e uma sintonia entre as pessoas presentes, pois em festas gigantes isso é difícil de acontecer.

Eu fui em minha primeira festa em 2003 e naquela época era perceptível que havia pelo menos dois públicos bem distintos, os que já conheciam o que acontecia ali e os que “cairam de para-quedas”. Eu fui um “paraquedista” que teve a sorte de ser muito bem apresentado ao que estava acontecendo ao meu redor, porque mesmo nessa época já tinham mais para-quedistas do que “instrutores” nos festivais. Isso é complicado porque nem todo mundo tem a sensibilidade de digerir facilmente o que acontece e/ou sente dificuldade em lidar com a liberdade que lhes é concedida num ambiente como esses, mesmo que momentaneamente (e é irrevogável que o trance implica, dentre outras coisas, em liberdade e autonomia).

Porém, essa nova popularização pode ter resultados que desconhecemos, porque no começo dos anos 2000, a cobertura sensacionalista da mídia e a falta de conhecimento sobre tudo que acontecia num evento desses levou a uma banalização e marginalização do movimento que torna essa nova popularização tanto possível como imprevisível (na minha opinião, esse tipo de cobertura reduziu bastante ao longo dos anos porque foi identificada uma elitização de parte do público daquela época e também porque o psytrance passou a ser reconhecido como um movimento cultural no Brasil).

Por outro lado, quando comparamos a qualidade e diversidade hoje, seja das músicas, das decorações, de toda a arte envolvida nessa cultura e também da organização dos eventos, nós vemos uma melhora e não piora da situação. Hoje a tecnologia avançou, os processadores estão mais potentes, os programas de produção musical estão mais acessíveis, existem várias pessoas ensinando na internet e nos festivais as diversas formas de expressões artísticas presentes, pessoas que muitas vezes aprenderam tudo sozinhas (estes literalmente desbravaram a mata pra poder chegar onde chegaram pois foram pioneiros, e é claro que os novos aprendem com os velhos e isso segue uma linha ascendente).

Tem muito mais produção hoje do que no passado, claro que nem tudo tem uma qualidade boa e nem tudo é psicodélico, mas muita arte genial pode ser encontrada nessa miríade de artistas. Essa melhora na qualidade tem pelo menos um motivo até onde eu posso ver, que é a possibilidade de profissionalizar todos os colaboradores do movimento à ponto de eles poderem investir tempo e estudo nisso, levando esse trabalho como um estilo de vida, não como um hobby.

É muito difícil viver trabalhando só com o trance, principalmente no Brasil, mas quanto mais eventos surgem e mais profissionalismo é visto, isso passa a ser cada vez mais possível.

Há também quem diga que a popularização faz com que um artista mude seu estilo, ou se limite em alguma vertente ou característica de seu trabalho pois percebeu o sucesso que ela tem. Mas é difícil avaliar isso porque naturalmente a criação de um artista vai mudando ao longo dos anos. Toda produção artística tende a evoluir conforme passa o tempo pois as pessoas também vão mudando e vão vivenciando novas experiências que se refletem na arte que elas vão criar, seja ela qual for.

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