Psy-House??

Publicado em 02/03/2010 - Por Eliel Cezar


Você, leitor amante da música eletrônica, provavelmente já ouviu a melodia da track acima em algum momento da sua vida. Trata-se de “Strings of Life“, do Rhythim is Rythim, um dos nomes usados pelo talvez mais genial precursor/criador do Techno, Derrick May. A track é de 1987 e é uma das mais tocadas e remixadas da história da e-music.
Mas, calma lá… Techno? Esse gênero não é baseado em marcantes batidas 4 X 4,  melodias contidas e secas, atmosfera por vezes pesada? Não seria o rótulo “House” mais apropriado para tanta melodia? Se bem que as sujas batidas da bateria eletrônica Roland TR909 e os timbres do sintetizador são a pura essência do Techno de Detroit… Seria um Tech-House, portanto, em plenos anos 80? Ou uma nova variante que poderíamos chamar de Techno-Jazz, Piano-House, Jazz eletrônico ou algum outro nome de impacto!?
Ironias de lado… acredito que, embora determinados elementos de uma música possam fazer referência a um outro estilo, não é uma única característica de uma track, por mais marcante que seja, que vai lhe etiquetar como da vertente X ou Y. Afinal, a música eletrônica sempre pautou sua evolução na reciclagem e na mistura. O Techno de hoje não é igual ao de 15 anos atrás, e com certeza será diferente nos próximos 15 anos, graças à influência de diversos tipos de música, da arte e dos movimentos culturais em geral.
Mesmo assim, a explosão no número de produções e produtores gerou também uma explosão dos gêneros. Hoje em dia, a especificação dos estilos chega ao microscópico. Detalhes bastam para transformar algo que na Chicago dos anos 80 seria simplesmente House em algo com três ou quatro nomes.
Assim, vez ou outra alguns DJ’s, produtores e “formadores de opinião”, objetivando serem “únicos”, “precursores”, revestirem-se de alguma aura intelectual ou por algum outro motivo, empregam toda a criatividade a serviço da fina arte de inventar novos rótulos para etiquetar determinadas tracks.
Nesse contexto, como não poderia deixar de ser, surgem algumas definições bem elaboradas e muitas aleatoriedades. Nessa segundo grupo, podemos incluir o que o DJ britânico Dave Mothersole curiosamente chama de “Psy House“.
Recentemente, o site Factóide publicou matéria – convido todos a lê-la – a respeito desse estilo, que segundo seu criativo criador, combina “o groove sólido do Tech House, o estilo de mixagem do progressivo e toques melódicos ambos do Detroit Techno e do Trance Old School”. Para exemplificar, colaciona algumas tracks de décadas passadas e atuais.
Curiosamente, uma das tracks exemplificadas é a clássica “At Les”, de Carl Craig, imperador da segunda geração dos techneiros de Detroit. Essa track, como as outras exemplificadas na matéria, possuem de fato elementos viajantes e hipnóticos, que talvez possam ser ditos psicodélicos.
Contudo, a essência de boa parte do que se produz em música eletrônica é justamente viajante e hipnótica. Com pouca pesquisa, encontram-se tracks antigas e atuais repletas de elementos psicodélicos, que nem por isso ensejam a criação de uma sub-vertente. Um exemplo bobo: confiram abaixo a track “Do You Like Bass”, do Felguk.


Reparem no break que começa lá pelos 2min45s. Não parece estranhamente… psicodélico? Ora, certamente estamos diante de um psychedelic electro, não?
Nada mais longe da verdade. Trata-se uma track tipicamente electro-house, com elementos “viajados” que remetem às influências musicais dos produtores. Nada que enseje a criação de uma nova vertente.
Esse raciocínio vale para as tracks ditas de psy house. O que temos ali é Deep House, Techno das antigas ou mesmo Trance, gêneros construídos e estabelecidos no decorrer dos anos. Ali não tem nada rasgando o manual.
O fenômeno da rotulagem serve apenas à criação de obstáculos à apreciação de música eletrônica. Invencionices servem tão somente para complicar algo que ja é complicado para a maioria da população. Ainda, além de afastar amantes da e-music, cria as dissenções internas, a formação de “guetos eletrônicos”: é a turma do psy, do minimal, do house…
Não há, portanto, base ou justificativa para fragmentar ainda mais o que ja é fragmentado. Nas palavras do amigo Guilherme Empke, DJ e colaborador eventual do Psicodelia, “Eu falo que toco techno com surpresinha; o cara fala que toca psy house. As pessoas perguntam ‘o que você toca?’. Se não for uma coisa muito definida, fica difícil de explicar. Daí vem essa coisa de inventar um monte de rótulos pra definir algo que deveria simplesmente  ser ouvido e sentido. ”
Enfim, o psy house continua não existindo. E se ele, por acaso, surgir ano que vem, não há nenhuma necessidade de correr para as gráficas imprimir o novo rótulo.

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