O popular verdadeiramente popular

Publicado em 02/08/2012 - Por

A popularidade. Meta sempre almejada por quase todos (por que não todos?) que trabalham com público, ou mesmo por quem deseje apenas ser conhecido e ter seu nome falado aos quatro cantos do globo. O “ser popular” é sinônimo de status, de fama, de sucesso. Interessa a muita gente. Quase sempre, motivo grande para fazer com se aja de todas as formas possíveis para a alcançar.

A internet tem sido uma grande ferramenta para DJs, produtores, instituições em geral, desenvolverem suas atividades e conseguirem cada vez mais público e reconhecimento. Com as imensas facilidades e utensílios que a grande rede oferece, pode-se em curto prazo obter resultados que, há uma década, levariam muito mais tempo para se conseguir. O campo das facilidades do www, neste sentido, sugere dois caminhos para o alcance da grande meta de tornar-se popular: a trilha ética ou a rota oportunista. Muitos artistas e instituições têm se dedicado a seguir pelo segundo lado.

Usemos como exemplo o famoso Top 100 da revista DJ Mag. Este pódio indica os melhores DJs (mesmo que o ranking inclua live performers como disc-joquéis, ou mesmo que nem sempre os melhores estejam lá) escolhidos através de votação popular. Por conta disso, é extremamente usado por promoters para seleção de artistas que serão contratados para apresentações: quanto melhor a posição do artista no ranking, maior será o retorno do investimento feito nele. É comum acompanharmos campanhas sadias de  DJs e produtores pedindo votos para um bom posicionamento nesta grade. Um dos mais criativos foi a campanha feita pelo presidente da Eslovênia para o conterrâneo Umek, publicado aqui mesmo no Psicodelia.

Por outro lado, muitos profissionais, renomados inclusive, usam subterfúgios pouco éticos para angariar votos e crescerem no ranking, o que os ajudaria a melhorar suas posições e cachês. Aumentaria a sua tal popularidade num primeiro olhar. A própria DJ Mag já divulgou situações de DJs que usaram mecanismos eletrônicos ilegais neste sentido. Os meios fraudulentos são vários, como softwares capazes de disparar inúmeros emails votando em um único artista, sistemas de códigos (scripts) que realizam trabalho semelhante, entre outras trapaças. Se fugirmos um pouco do mainstream e vivenciarmos o underground da discotecagem, perceberemos que é surpreendente como estas tecnologias torpes têm ganhado espaço e servido de recurso e ferramenta importante para artistas parecerem maiores e mais populares do que são. A tática é simples. 

  – Pareço famoso, já que tenho várias pessoas (muitos são fantasmas, outros nem sabem que me seguem, mas tudo bem) curtindo meu trabalho. Logo, outras irão se interessar por mim, achando que sou o fodão.

A tática teria seus méritos se o crescimento profissional do artista fosse galgado em fãs verdadeiros e realmente interessados em sua atividade. Mas aqui o foco é o número frio. Esquece-se do principal, o conteúdo e o interesse verdadeiro naquilo que de fato se é. Ou seja, esquece-se da popularidade real. Me parece que a discussão vai além do comentário óbvio de que verdadeiros artistas, ou verdadeiros homens de caráter em uma instância maior, não usariam este mecanismo para crescerem. Todos os dias, acompanho um trabalho árduo dos meus alunos e de vários amigos buscando alcançar reconhecimento através de métodos honestos. Evidentemente, me orgulho de os ver conquistando seu espaço desta forma íntegra e pura.

Mas o grande debate reside na análise do caráter de quem usa esta ferramenta mentirosa. Me faço uma pergunta bastante simples: como alguém que busca enganar as pessoas pode querer cobrar algo de alguém? Querer a verdade de alguém? Países como os Estados Unidos valorizam muito a questão da popularidade. Ser popular é sinônimo de poder, de bom posicionamento. Mesmo que discutamos a questão moral que rege o “querer ser popular”, há algo positivo a se considerar nisso: podemos ver a popularidade, uma vez que ela acontece durante as relações pessoais diretas, como na rua, na escola, no trabalho.

Com a internet, a popularidade acontece virtualmente, e pode ser facilmente camuflada. Já acompanhei inúmeros profissionais falando sobre criar perfis falsos em redes sociais como forma de estímulo à imagem do DJ, os usando para gerar relacionamentos virtuais que poderiam interessar outras pessoas a fazerem o mesmo. Outros ensinam a usar mecanismos eletrônicos para aumentar números de seguidores e fãs, criando uma popularidade maior do que a que se tem realmente. Tecnicamente, nem mesmo o número de amigos nas redes sociais poderia, preliminarmente, ser levado em consideração na avaliação da popularidade real, uma vez que qualquer um pode adicionar e aceitar novos contatos.

Para mim, está cada vez mais claro, e sinto isso todos os dias, que ser popular vai além do número que se tem em qualquer página que seja, mais sim do uso que se faz dos seguidores que se possui. Ter milhões de fãs em sua página, e perceber que uma porcentagem pequena deles interage com você é um exemplo clássico do nível de sua popularidade. Possuir vários amigos em seus contatos, e identificar que a interação que se tem com eles é ruim e sem peso agregativo, tanto em termos numéricos quanto de conteúdo, também reflete o nível de sua popularidade. Ou seja, números podem até atrair, mas a manutenção e a obtenção verdadeira de novos fãs passa diretamente por aquilo que você cria, compartilha e fala. Isso é ser popular, de verdade. 

Enquanto nos basearmos em um apelo numérico visual baseado em mentiras, pensando que somente ele pode o tornar maior e mais famoso, cometemos um pecado mortal: julgamos as pessoas pela embalagem e não pelo conteúdo. O trabalho harmônico entre crescimento de popularidade baseado em conhecimento, informação e divulgação assídua e inteligente de sua imagem é o que faz do produto um item a ser consumido. É claro que este crescimento leva tempo, mas se sustenta em números verdadeiros, fãs verdadeiros. Há alicerce real em seu trabalho. Há caráter em seu trabalho.

Em uma esfera maior, me é cristalino que este tipo de atividade mentirosa é uma das roldanas que fazem o sistema de corrupção que rege as relações em nosso país ser tão forte. Falamos muito enquanto cidadãos, fazemos pouco quando temos a oportunidade de mudar as coisas. Neste sentido, ser um falso popular, moldado com base em mecanismos mentirosos, é apenas um dos pontos a serem pensados. Primemos pelo conhecimento, tentemos ser referência de conteúdo, seja qual for o ramo de atividade. Sejamos verdadeiros. Sejamos realmente populares.

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